
Helena OSORIO
4 de mai. de 2020
Exclusivo Maria Gambina: "A produção está controlada, embora tenha parado de produzir novas peças estes últimos dois meses"

Helena OSORIO
4 de mai. de 2020
Maria Gambina abre a sua loja, na Foz do Douro (Porto), segunda-feira (4 de maio), na chamada primeira fase do desconfinamento em Portugal. A estilista portuguesa que é uma mais requisitadas e de maior reconhecimento internacional, na área do streetwear vende também através do Instagram @maria_gambina.
Em entrevista exclusiva, ao site FashionNetwork.com, e remetendo ao estado de emergência findo a 2 de maio, a designer diz que "a produção está controlada, embora tenha parado de produzir novas peças estes últimos dois meses".
Gambina conta, ainda, como deu os primeiros passos na moda e de que forma o concurso Coup de Lune da Air France e Hotel Meridien, moldou o seu destino, logo em 1990. Estudava Pintura, na Escola Superior de Belas Artes do Porto, e Moda no CITEX. O entusiasmo de ser reconhecida, antes de terminar a formação no CITEX, acabou por a desviar do caminho das artes plásticas. Depois deste primeiro prémio, foi agraciada uma dezena de vezes.

A música (e tudo o mais em redor) foi desde sempre uma inspiração maior para Maria Gambina. O seu feeling e aposta na moda não falharam. Depois do 1.º prémio do Coup de Lune, ficou em 3.º lugar no concurso FIOS Fisip (1992) e em 1.º no concurso Sangue Novo da Moda Lisboa (1992 e 1993); logo depois, foi agraciada com 1.º prémio da Bienal de Jovens Criadores da Europa e do Mediterrâneo (1994); Criadora do Ano’ 97 pela Look Elite; 1.º prémio para as fardas da EXPO 98, juntamente com José António Tenente (1997); Globo de Ouro na categoria Personalidade do Ano-Moda (1998); e a sua coleção, Music in my Life, venceu o prémio da melhor coleção feminina promovido pela Moda Lisboa (2000); 1.º prémio do concurso de vestuário personalizado para os funcionários ADERTURN-Turismo e Norte de Portugal (2004); 1.º prémio no design de uniformes para o Colégio Efanor de Matosinhos (2008).
Em março de 2000, participou no calendário oficial da Semana da Moda de Paris, ao integrar o desfile Portugal Fashion International Les Créateurs Portugais e, em 2006, recebeu o prémio de Melhor Estilista, na categoria de Moda, atribuído na Gala The Best of Porto. Foi a designer escolhida para representar Portugal, como embaixadora, no âmbito do projeto Euro-Fashion/ Fashion ft. Football 2012, na Ucrânia.
A música entrou nas primeiras coleções de Gambina, como o ambiente do Porto, nos anos 80 e 90 do século XX, uma interminável passerelle de moda onde os jovens se faziam notar pela criatividade, especialmente nas saídas à noite em espaços como o Anikibobó, Bibó Porto, Griffons, Indústria, Lá Lá Lá, Swing. A cultura musical acompanhava este ritmo, com a fundação de várias bandas que se eternizaram no tempo, como os GNR que se tornaram tão conhecidos com Portugal na CEE e Sê um GNR (1981), dando Rui Reininho a voz, e Pronúncia do Norte (1992) com Isabel Silvestre; os Táxi, banda também nascida no Porto um ano antes (1979), famosa pelas canções Chiclete, Meu Manequim, Tv-Wc e Vida de cão (1981); os Trabalhadores do Comércio desde 1979, com Binhu Garrafas de Binho, Chamem a Polícia e Sim, Soue um Gaijo do Porto (1981), Taquetinho ou Lebas no Fucinho (1995); Pedro Abrunhosa com os Bandemónio e Tudo o que eu te Dou (1994) ou Se eu Fosse um Dia o teu Olhar (1996); Rui Veloso com os êxitos Chico Fininho e Sei de uma Camponesa (1980), Porto Sentido e Porto Côvo (1987).
O final do século XX foi um período de vida e liberdade. Já o início do novo milénio, marcou extremos como a mudança radical na mentalidade com as viagens, redes sociais e globalização que foi agora refreada com a pandemia de COVID-19 a ameaçar a Humanidade, enquanto não existir uma vacina eficaz.
Como tantas outras no Porto e no país, a loja de Maria Gambina reabre, na Foz do Douro, esta semana, com o levantamento gradual das restrições impostas desde março, e uma vez que o governo português decidiu não prorrogar o estado de emergência face à COVID-19, mesmo que a doença continue a somar casos e mortes em Portugal e no mundo.
Foram mais de 40 dias em casa e, agora, continuam a cumprir-se os mandamentos. Apesar de Gambina não produzir máscaras (ou vestuário de proteção), estas são finalmente obrigatórias e o incumprimento leva mesmo a multas entre os 120 e 350 euros. Nas lojas é, também, obrigatório ter à entrada uma solução à base de álcool para as mãos.

FashionNetwork.com: Quais as medidas tomadas, pela Maria Gambina, durante os meses de confinamento?
Maria Gambina: Como só vendo na minha loja e através do meu Instagram @maria_gambina, a produção está controlada embora tenha parado de produzir novas peças estes últimos dois meses.
FNW: Com a obrigatoriedade de máscaras, nesta primeira fase de desconfinamento, estas vão passar a fazer parte das suas coleções?
MG: Todas as minhas peças são produzidas em pequenos ateliers que estão fechados, por esse motivo não produzo máscaras ou fatos de proteção.
FNW: Recuando ao tempo em que se iniciou na moda, Maria Gambina natural de Oliveira de Azeméis, cedo veio viver para o Porto onde frequentou o curso de Pintura da Escola Superior de Belas Artes, em 1989. Porque não o concluiu?
MG: Concorri para o Curso de Design de Moda do CITEX porque não tinha a certeza se entraria em Pintura nas Belas Artes, acabei por entrar em ambos. Durante um ano frequentei o CITEX de dia e as Belas Artes à noite, o que foi extremamente exausto pois o CITEX era muito exigente. Talvez tenha sido essa exigência, o sentir que estava em constante aprendizagem, aliado ao facto de ter vencido logo um concurso no meu primeiro ano do CITEX, o concurso Coup de Lune, assim como de ser um curso mais curto, acabou por me influenciar a desistir das Belas Artes.
FNW: Acabou por tirar o curso de Design de Moda do CITEX, também no Porto, que concluiu em 1992. Ser designer de moda foi um sonho? E, a breve aprendizagem em Pintura, foi útil na moda?
MG: Não, nunca foi um sonho, nem nunca tinha pensado nisso, foi um acaso. Concorri ao CITEX apenas porque não sabia se entrava em Belas Artes e porque tinha professores das Belas Artes a lecionar. Só estive um ano nas Belas Artes e foi um ano muito teórico.
FNW: Mesmo antes de terminar o curso no CITEX e logo depois, foi galardoada numa série de concursos. De que forma este reconhecimento mudou o percurso, traçando o caminho de sucesso?
MG: Os prémios são sempre um reconhecimento do trabalho, no meu caso também serviram como incentivos. Não consigo saber se foram responsáveis pelo meu percurso, se traçaram o caminho de sucesso. Acredito que fazem parte do meu percurso, mas o caminho do “sucesso” só se fez com muito esforço, dedicação, paixão, conhecimento, uma forte personalidade e uma certa teimosia.
FNW: Lecionou oito anos, no CITEX (1994-2002), e 10 na ESAD (2008-2018). De alguma forma o ensino e a troca de saberes e opções estéticas com os alunos influenciam a sua obra?
MG: O ensino e a troca de saberes influenciaram-me muito. As opções estéticas nem por isso.
FNW: Foi professora de Katty Xiomara, Nuno Baltazar, Paulo Cravo, Ricardo Andrez, entre outros, e agora da nova geração de jovens designers em ascensão, de Beatriz Bettencourt, David Catalán, Gonçalo Peixoto, Inês Torcato, Joana Braga, Olimpia Davide, Rita Sá e Tânia Nicole. Estes nomes foram desde logo uma descoberta, ou foram-se fazendo?
MG: Depende dos casos, existem alunos que me apercebo logo que têm uma sensibilidade apurada e talento, outros que se tem que trabalhar muito. Mas, em ambos os casos, vão-se fazendo ao longo dos cursos nas várias disciplinas interdisciplinares.
FNW: Considerada hoje uma das estilistas portuguesas mais requisitadas, na área do streetwear, inspira-se nos movimentos musicais e artes de rua para criar (consta). Em que cenários busca esta inspiração?
MG: As minhas inspirações vêm sempre das referências que me rodeiam e me tocam de alguma forma. Não é assim tão linear que seja a música ou movimentos urbanos, de certa forma é tudo que me desperta alguma curiosidade e que o único elo de ligação sou eu mesma.
FNW: Aposta na venda exclusiva em lojas próprias da marca, tendo, em 1995, aberto a primeira na Foz do Douro, no Porto, e a segunda, em 1999, no Saldanha, em Lisboa. Como correram as experiências.
MG: Neste momento só tenho a loja da Foz. Por viver no Porto e não ter uma estrutura grande, tornou-se impossível acompanhar a loja de Lisboa à distância.

FNW: Em 1997, desenhou com José António Tenente, o projeto vencedor para as fardas dos funcionários da Expo'98. Distinguida como criadora do ano pela Elite Model Look, em 1997, apresentou a coleção outono-inverno em Estocolmo (Suécia), a convite do ICEP. No ano seguinte, participou com a coleção outono-inverno 1998/99, no Workshop de Paris, então inédito na moda portuguesa. Em 1998, apresentou a coleção primavera-verão no festival Memphis in May, nos EUA. Em 1999, voltou a marcar presença no Workshop de Paris, com a coleção 1999/2000, o que acabou por abrir portas do mercado japonês. Em finais de 1999, levou a São Paulo, a coleção verão 2000, graças ao convite feito para participar no Portugal Fashion Internacional. Quais destes foram os eventos mais marcantes e quais definiram a internacionalização?
MG: Para mim o evento mais marcante foi vencer, em parceria com o Tenente, o concurso das fardas da EXPO 98. Era uma miúda e deu-me muita projeção, a EXPO 98 foi um grande acontecimento em Portugal visitado por milhões de pessoas e todos sabiam que as fardas eram nossas. Através do Portugal Fashion entre 1999 e 2005 apresentei coleções em vários eventos internacionais, onde tive maior visibilidade e de certa forma se começou a traçar um caminho para a internacionalização foram as minhas apresentações na PASSARELA GAUDI em Barcelona, Espanha. Mas, infelizmente, depois acabou. Atualmente, não considero que tenha uma carreira internacional.
FNW: Atualmente, quais as participações mais significativas.
MG: Só apresento no Portugal Fashion no Porto.
FNW: Quais dos reconhecimentos a marcaram definitivamente e mudaram o curso da carreira.
MG: Todos eles tiveram um papel relevante na minha carreira mas não sinto que algum tenha mudado o meu percurso, apenas o fortaleceram.
FNW: Como amante da música, em especial do jazz, soul ou bossa nova, que assiste particularmente na noite do Porto. De que forma este mundo musical entra nas suas coleções?
MG: Como tudo o que me rodeia, mas posso dizer que a música que eu ouço já foi responsável por muitas histórias, paletas cromáticas e volumetrias nas minhas coleções.
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