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25 de fev. de 2021
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Pilar do Rio: “Participar no Sangue Novo trouxe-me uma nova e inesperada ligação à moda portuguesa”

Publicado em
25 de fev. de 2021

A jovem designer de moda algarvia Pilar do Rio – distinguida em 2018 com o 2.º lugar na competição Inseta x POLIMODA (Itália), que em 2020 foi vencedora do Prémio Público da edição do Sangue Novo / ModaLisboa (Portugal) – fez o circuito de um triângulo criativo (quiçá também amoroso) – como seja Lisboa, Florença, Londres onde se formou e trabalhou. Recentemente regressou à cidade natal de Lagos de onde saem as suas criações para o mundo, em particular via Instagram.


Pilar do Rio, a jovem designer algarvia que trabalha de Lagos para o mundo - Foto: Pilar do Rio


Pilar do Rio licenciou-se em Design de Moda pela Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa, em 2017. No mesmo ano, mudou-se para Florença onde completou o mestrado em Design de Moda na Polimoda, escola particular de moda italiana classificada entre as 10 melhores do mundo.

Em 2018, regressou a Lisboa para estagiar com Constança Entrudo. Posteriormente mudou-se para Londres para iniciar um estágio com Faustine Steinmetz e, depois, com Marques’Almeida onde mais tarde assumiu os cargos de Product Developer e Brand Assistant.

Pilar do Rio regressará agora à Lisboa Fashion Week – ModaLisboa, de 15 a 18 de abril, desta vez com uma coleção de joalharia em colaboração com o projeto Fora de Jogo. Esta edição denominada ModaLisboa Comunidade será exclusivamente digital e transmitida em multiformato.

Em entrevista ao site FashionNetwork.com, Pilar do Rio aborda as urbes que a marcaram na moda e na vida, referindo-se a Lisboa como “uma cidade pela qual sinto tanto amor e à qual estava ligada com uma identidade, enquanto designer”; encontrando em Florença “um ambiente culturalmente familiar e descontraído”; e descrevendo Londres como “uma montanha-russa de emoções”.

Lagos embora pareça distanciado deste triângulo experimental de vivências é, para a designer, “um espaço de paz e tranquilidade que faz parte das minhas raízes” e onde tudo brota. A sustentabilidade também é uma preocupação constante no trabalho de Pilar do Rio, que lhe proporciona uma exclusividade gratificante.


Imagem da campanha publicitária da coleção de Pilar do Rio para a estação de primavera-verão 2021 - Foto: Pilar do Rio


FashionNetwork.com: Pilar do Rio é nome artístico?
Pilar do Rio: De facto, é uma pergunta que me é feita com alguma frequência, mas Pilar do Rio é mesmo o meu nome! Nem sempre pensei assim quando era mais nova, mas hoje em dia considero-me sortuda pelo nome e orgulho-me de o assumir profissionalmente.

FNW: Licenciou-se em Lisboa e tirou o mestrado em Florença na mesma área de Design de Moda. Sentiu diferença entre os mundos e o ensino? De que forma.
PR: Foram experiências muito diferentes com as quais aprendi bastante, não só no campo da moda, mas também sobre mim mesma. Portugal mostrou-me uma visão mais técnica e objetiva da indústria – aprendi a importância de desenvolver um produto com qualidade. Itália empurrou-me para fora da minha zona de conforto, sendo que a realidade da Moda de Luxo / High Fashion tornou-se mais palpável. Ganhei mais consistência na minha identidade enquanto designer e entendi que há um nicho para o que posso vir a desenvolver, tanto dum ponto de vista artístico como num outro desta indústria.  

FNW: Como foi viver em Florença – cidade onde nasceu a moda italiana com o primeiro desfile de alta moda nos anos 50 (note-se)…
PR: Florença, à semelhança de Lisboa, tem um ambiente culturalmente familiar e descontraído, isso tornou a minha primeira experiência fora de Portugal mais fácil e interessante.


Look da coleção de Pilar do Rio para a primavera-verão 2021 numa produção para o lookbook em Monsanto - Foto: Pilar do Rio


FNW: Posteriormente, estagiou em Lisboa com Constança Entrudo e depois em Londres com a dupla portuguesa da Marques’Almeida (Marta Marques e Paulo Almeida). Como correu a adaptação a cidades e a chancelas tão distintas, sendo que acabou por ficar a trabalhar nesta última marca de moda britânica reconhecida internacionalmente?!
PR: As experiências foram efetivamente distintas. Voltar a Lisboa depois de viver em Itália foi um momento catártico – por regressar a uma cidade pela qual sinto tanto amor e à qual estava ligada com uma identidade, enquanto designer, muito diferente da que tinha desenvolvido após o mestrado na Polimoda. Foi importante usufruir do conforto e familiaridade que senti ao regressar a Lisboa e, consequentemente, durante a minha experiência a trabalhar com a Constança.  
Londres foi uma montanha-russa de emoções.

FNW: E porquê?
PR: Antes da Marques’Almeida estagiei com Faustine Steinmetz, daí ter sido um percurso repleto de aprendizagens e novos inputs. Para além da experiência incrível que tive com a equipa da M’A, aprendi imenso sobre a indústria; acompanhar o desenvolvimento criativo, produção, criação de media e a participação na London Fashion Week, foram um passo importante para um sonho tornado realidade.  

FNW: O que mais a marcou em Londres?
PR: Londres deu-me a conhecer o quão versátil podemos ser como criativos, permitindo-me explorar diferentes facetas artísticas. Tive a oportunidade de me associar a projetos no ramo da fotografia, styling, art direction. Tudo isto foi possível também pela energia entusiasta, pró-ativa e colaborativa das pessoas com quem me cruzei.


Pormenor de peças de roupa singulares feitas de retalhos de tecidos com padrões gráficos - Foto: Pilar do Rio


FNW: A primeira distinção aconteceu ainda em Itália…
PR: Sim, em 2018 fui premiada com o 2.º lugar na competição Inseta x POLIMODA. Este projeto resultou de uma pesquisa relativa à evolução do vestuário militar, que senti grande prazer em desenvolver. Tive a possibilidade de visitar um dos maiores arquivos de guarda-roupa na Toscânia e foi uma experiência enriquecedora. 

FNW: Volvidos dois anos foi agraciada vencedora do Prémio Público da edição do Sangue Novo / ModaLisboa. Que horizontes se abriram a partir daí?
PR: Após a edição de outubro de 2020 da ModaLisboa, surgiram várias oportunidades de crescimento profissional, pelas quais estou muito grata. Para além da exponencial exposição através das redes sociais, desenvolvi projetos e novas colaborações com stylists, fotógrafos e criativos, que conheceram o meu trabalho através da rede que a ModaLisboa catalisa.  
Participar no Sangue Novo trouxe-me uma nova e inesperada ligação à moda portuguesa, o que me deixa muito feliz por receber o apoio e reconhecimento que tenho vindo a sentir neste último ano.  

FNW: Vai participar na ModaLisboa Comunidade, de 15-18 de abril, exclusivamente digital. Em que formato?
PR: Nesta edição de abril de 2021 da ModaLisboa, vou participar com uma coleção de joalharia em colaboração com o projeto Fora de Jogo. Esta cápsula vai ser apresentada no segmento do Sangue Novo. O dia ainda não foi divulgado, porém será em formato digital, disponível nas plataformas da ModaLisboa.


Estilo hippie chic com recorrência a missangas e desenhos naïf - Foto: Pilar do Rio


FNW; Como classifica esta experiência digital?
PR: O conceito de experiência digital é uma clara reflexão desta nova realidade. A semana da moda é um espelho sazonal muito importante desta indústria em Portugal, e no Mundo, daí que seria impensável a possibilidade de esta não existir como um evento físico e social. Porém é inevitável, e um pouco singular, mas a experiência nos moldes digitais mostrou-se segura e o mais real que podemos proporcionar ao espectador.

FNW: Considera que este formato é agora e continuará provavelmente a ser o ideal?
PR: Não considero o formato ideal, mas tenho de realçar todo o trabalho, esforço e inovação que está por detrás da concretização deste novo evento, abrindo sempre a possibilidade de se reinventar e melhorar daqui para a frente, garantindo a sua continuidade. 

FNW: Tem outras semanas da moda na mira?
PR: Acredito que qualquer designer, ao longo do seu percurso, quererá apresentar-se em diferentes semanas da moda, tendo em conta o leque de contactos e o mediatismo que a experiência acarreta. Pessoalmente seria incrível ter a oportunidade de me apresentar noutra semana da moda, tendo em conta a experiência que tive através da ModaLisboa. Para além de ser exposta a novos ambientes e diferentes públicos, ganhar mais visibilidade internacionalmente será fulcral no meu crescimento como designer. 

FNW: Qual seria a semana da moda eleita?
PR: Se tivesse de especificar, escolheria provavelmente a de Londres – não só pela magnitude do evento em si, mas também pelo facto de me ter aberto horizontes no sentido da minha liberdade criativa.


Profusão de missangas e rendas nas peças da coleção de Pilar do Rio para a estação de primavera-verão 2021 - Foto: Pilar do Rio


FNW: Qual é o tema da nova coleção?
PR: A moda é um reflexo da sociedade – trabalhamos constantemente para o amanhã, antecipando o que poderá, ou não, ser desejado pelo nosso público-alvo, analisando também quem pertencerá a esse núcleo. O exercício de análise e de antecipação tem um certo peso no meu processo criativo. Quero refletir no meu trabalho a minha idealização do futuro, porque de alguma forma sinto que é a minha tentativa de influenciar a sociedade. Dito isto, tenciono criar uma atmosfera mais inclusiva, consciente e tolerante.  

FNW: E os materiais usados…
PR: Em termos de recursos (e volto a repetir-me acerca desta temática) procuro constantemente soluções sustentáveis e num espectro colaborativo. Quero oferecer uma experiência sem rótulos ou barreiras, dando maior relevância ao conceito Upcycling, porque é assim que eu vejo o futuro.

FNW: Onde foram captadas as fotos da mais recente campanha e lookbook?
PR: As fotos da campanha e lookbook foram captadas na zona de Monsanto, em Lisboa, pelo fotógrafo Nuno Vieira. Optei por uma zona mais central do país onde podia reunir com maior facilidade as pessoas ideais para o projeto. Sendo que o Nuno (fotógrafo) está no Porto e as modelos Beatriz Bonito e Inês Mendes em Lisboa.

FNW: E Lagos onde vive?
PR: Lagos servirá de cenário para futuras campanhas, certamente!


Pormenor de corpete de Pilar do Rio cravejado de pedraria - Foto: Pilar do Rio


FNW: Esta nova coleção é quase como um apelo à natureza, evocando os hippies dos anos 60… 
PR: É necessário e urgente revisitar as origens, entender o passado para construir o futuro. Estamos cada vez mais desconectados e desapegados da Natureza, isso reflete-se nas nossas ações e no seu impacto ambiental. O apelo à comunhão da sociedade e natureza são uma mera sensibilização estética de uma temática que é um pouco mais politica. Tal como nos anos 60-70, o desejo de mudança, a luta pela igualdade e sensibilidade foram marcos da época, penso que hoje são conceitos que devem ser desconstruídos e repensados. 

FNW: É um caminho para a sustentabilidade? De que forma se preocupa com o tema?
PR: A sustentabilidade é, de facto, um tema e uma preocupação constante no meu trabalho. Por vezes, principalmente como “pequena designer”, torna-se bastante desafiante equilibrar a minha própria consciência ambiental e o compromisso da inovação. Desenvolver uma produção sustentável pode ser mais limitativa em termos de recursos, porém traz uma exclusividade que acaba por ser gratificante.

FNW: Quais as contribuições.
PR: Honestamente, em determinados momentos, surgem dúvidas e inseguranças em relação à legitimidade da sustentabilidade na moda, não obstante, faço o meu melhor para que isso se torne numa motivação. Ser consciente do impacto das minhas ações é algo que tento trazer comigo, projetando esses ideais no trabalho e no meu quotidiano, dentro das minhas possibilidades. 

FNW: É possível criar de Lagos para o mundo? Como.
PR: Penso que podemos sempre criar independentemente do espaço físico onde nos encontramos. Porém, o sítio onde nos encontramos influencia o nosso estado de espírito e o impacto do mesmo no resultado criativo. Resumidamente: sim, é possível criar de Lagos para o mundo. Sendo honesta, o processo criativo da minha última coleção foi bastante nómada. Movimentei-me entre Lisboa, Londres e Lagos e, genuinamente, isso refletiu-se no seu resultado. Lagos foi o local onde tudo começou a tomar forma fisicamente. É uma cidade pequena onde muitas vezes perco a conexão com o conceito standard de Moda, mas é onde me associo a um espaço de paz e tranquilidade que faz parte das minhas raízes.


Jogo de diferentes matérias e texturas num look de Pilar do Rio para a primavera-verão 2021 - Foto: Pilar do Rio


FNW: Onde se podem comprar as peças Pilar do Rio?
PR: Grande parte das peças são custom-made, feitas por encomenda, normalmente, através do Instragram ou por e-mail. Quando existem peças em stock a comunicação é feita pelo Instagram e restantes redes sociais.

FNW:  Prevê o online já tão presente como o futuro, ou acredita que a experiência no espaço físico não pode morrer?
PR: O online veio trazer uma proximidade entre os espectadores e amantes da moda, deixa-nos em pé de igualdade. Independentemente da distância, podemos ter acesso à mesma informação e experiência que uma pessoa no outro lado do mundo. Penso que abriu portas para inovar e criar novos universos e experiências virtuais. 

FNW: Acredita que irá suplantar o físico?
PR: Não há como iguala-lo à experiência do espaço físico.
Os detalhes, o brilho, as texturas, as cores, o movimento e o cair do tecido são coisas que fazem parte de uma atmosfera sensorial que não pode ser 100% representada através de um ecrã. Tenho de referir que a momentaneidade e efemeridade do evento no espaço físico têm também uma certa beleza. 

FNW: Quais os projetos para o amanhã?
PR: Gosto de acreditar num Futuro colaborativo e versátil. Irei continuar a desenvolver projetos, em associação a outros criativos e, em diferentes áreas. Mais do que conceber um produto em meu nome, quero criar uma resposta a algo maior e com qualidade. Sem dúvida que fará sentido dar continuidade a esta plataforma associada à Moda, Joalharia, Fotografia, Direção Criativa e Sustentabilidade, que tenho vindo a criar organicamente nestes últimos anos.   
Por outro lado, e tendo em conta a rede de trabalho com a qual tenho vindo a contactar, não excluo a possibilidade de me voltar a juntar a um projeto semelhante aos quais estive envolvida no passado. Fazer parte de um núcleo que está já estabelecido e consistente no mercado – que vem ficando progressivamente mais saturado – aliado com a possibilidade de integrar uma equipa, poderá resultar, a meu ver, em algo sólido e mais ambicioso.  

FNW: E hoje?
PR: Neste momento da minha carreira sinto que não me encontro na posição de ancorar a um rótulo / posição especifico/a, estando capaz de abraçar as diferentes vertentes e oportunidades que surgirem daqui para a frente.
 

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