Portugal Textil
23 de set. de 2020
Retalho em retoma
Portugal Textil
23 de set. de 2020
A recuperação do mercado do vestuário mundial para os níveis anteriores à pandemia só deverá acontecer em 2022. Os retalhistas portugueses, contudo, estão empenhados em encontrar estratégias para ganhar a confiança dos consumidores.

O Covid-19 deverá reduzir em 297 mil milhões de dólares (cerca de 264,4 mil milhões de euros) o mercado mundial de vestuário em 2020, num cenário que coloca a queda em 15,2% face a 2019.
De acordo com a previsão da GlobalData, os 10 mercados mais afetados representam 85% das perdas, com os mercados mais maduros a serem os principais prejudicados – os EUA deverão representar 42% das perdas, devendo levar a que diversas cadeias de retalho apresentem pedidos de insolvência nos próximos meses.
Embora a retoma tenha já começado um pouco por todo o mundo, deverá variar dramaticamente em função da confiança do consumidor, da dependência do turismo do país, do estado da economia e desemprego e do nível de “compras de vingança”, que a GlobaData define como a libertação repentina da procura reprimida por parte dos consumidores que querem e podem gastar.
Algumas marcas na China, por exemplo, estão a registar vendas na ordem dos 80% a 100% em comparação com os níveis anteriores à pandemia, enquanto retalhistas em partes da Alemanha estão igualmente a sentir uma retoma melhor do que a esperada. Não obstante, players em regiões como Hong Kong, que está muito dependente dos turistas, vivenciam condições mais difíceis e, embora seja ainda demasiado cedo para avaliar a retoma em Itália, a GlobalData prevê que «seja longa – o mesmo deve aplicar-se a França, aos EUA e ao Reino Unido».
A GlobalData antecipa, todavia, que o consumo de vestuário cresça 17,1% em 2021, embora tal não compense a perda de vendas este ano. «Mesmo que os retalhistas, em alguns mercados, experienciem as compras de vingança nos primeiros meses após o levantamento do confinamento e vejam o comércio regressar aos níveis de 2019 no segundo semestre, nos 49 mercados que cobrimos não esperamos que isso compense os períodos sem vendas no primeiro semestre», salienta. Em 2019, o mercado mundial de vestuário estava avaliado em 1,96 biliões de dólares e «não deverá regressar ou ultrapassar isto até 2022», indica a GlobalData.
Mercados maduros mais afetados
Os mercados maduros serão os mais prejudicados, com os confinamentos por causa da pandemia e o golpe na confiança dos consumidores a acelerar a gravidade das condições existentes. Muitos retalhistas do mercado de gama média em mercados maduros estão há 10 anos a perder relevância, não tendo sido capazes de evoluir para acompanhar os hábitos de compra, numa altura em que a transferência dos gastos do retalho para os tempos livres também afetou as suas perspetivas a longo prazo – fazendo com que, segundo a GlobalData, «a atual crise seja o fim para muitos operadores já em dificuldades». JC Penney, Neiman Marcus e J.Crew nos EUA e Oasis/Warehouse no Reino Unido são alguns dos nomes já em dificuldades. «O que ficará no pós-Covid em mercados maduros é um mercado de gama média ainda mais reduzido, demasiada capacidade na high street e nos centros comerciais e uma maior dominância dos líderes mundiais do mercado de moda – como a Inditex e o grupo H&M», resume a GlobalData.
Apesar do impulso que o Governo tem procurado dar – por exemplo, no passado dia 8 de maio, o Primeiro-Ministro António Costa, juntamente com o presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira, visitou diversas lojas na Rua da Santa Catarina, uma das principais artérias comerciais da Invicta, incluindo a loja das insígnias lusas Ana Sousa e Temperatura –, os primeiros números do pós-desconfinamento em Portugal, do final de maio, dão conta de quebras nas vendas de 50% e 70% no Porto e em Lisboa, respetivamente, segundo as associações de comerciantes das duas cidades. «A maior parte está a recuperar gradualmente, lentamente, embora se sinta alguma recuperação. Estamos com alguma expectativa para que comece a crescer a partir de dia 1 de junho e sobretudo durante o período de férias», afirmou o presidente da Associação de Comerciantes do Porto, Joel Azevedo, à TSF.
«Não é de um momento para o outro que as pessoas carregam num botão e passam a ir a restaurantes e lojas», admitiu Nuno Botelho, presidente da Associação Comercial do Porto.
«Tudo o que não seja bens de primeira necessidade…as lojas de comércio normal de rua, moda, sapatarias têm muito pouco movimento», destacou Maria de Lourdes Fonseca, presidente da União de Associações de Comércio de Serviços de Lisboa.
Do lado das marcas e retalhistas, as incertezas são muitas. «Uma coisa que esta pandemia nos veio ensinar foi a não fazer grandes projeções a longo prazo. O mundo ainda vive a incerteza relativamente ao comportamento do vírus e às possíveis repercussões do desconfinamento. No entanto, e para o bem de todos, a vida tem que continuar e nós na MO estamos confiantes que – apesar da contração económica que se avizinha – temos a proposta de valor certa para os nossos clientes, estamos localizados onde lhe é mais conveniente ir e continuamos a acompanhar a sua família mais próximos do que nunca», revela, ao Jornal Têxtil, Diana Teixeira Pinto, head of marketing & e-commerce da MO.
Estratégias nacionais
Durante o período de confinamento, «o maior desafio passou por encontrar novas soluções que nos permitissem continuar a estar ao lado das famílias em Portugal e dar respostas às suas necessidades» e, depois de um período de adaptação, «registámos um aumento significativo do volume de encomendas online, uma situação notada ainda mais quando lançámos um produto inovador que quisemos levar ao maior número de pessoas possível: uma máscara reutilizável feita em parceria com a comunidade industrial, científica e académica portuguesa, que registou uma procura que excedeu totalmente as nossas expectativas», conta Diana Teixeira Pinto.
As compras digitais parecem ter sido as grandes beneficiadas desta pandemia, acelerando uma tendência que era já registada, no mundo e em Portugal. Um estudo realizado pela Mastercard em 15 países europeus concluiu que o comércio eletrónico superou todas as expectativas desde que se iniciaram os períodos de confinamento na Europa. Em Portugal, 54% dos inquiridos revelaram estar a fazer mais compras online do que nunca e 30% revelaram estar a gastar mais dinheiro em experiências virtuais do que no início do ano. Livros (30%), utensílios de cozinha (21%) e tinta para o cabelo (16%) estiveram entre os produtos mais populares durante o confinamento, com os consumidores portugueses a valorizarem sobretudo o preço (73%) e a rapidez (56%). 41% dos inquiridos portugueses admitiam ainda que, nas compras online, se mantiverem fiéis às lojas físicas onde habitualmente efetuam as compras.
Na MO, nos últimos três meses, as vendas aumentaram «na casa dos três dígitos percentuais», afiança a head of marketing & e-commerce. «Queremos que os nossos clientes voltem às nossas lojas, que nos voltem a visitar, que se sintam em segurança e plenamente confiantes, mas será expectável que a procura pelo online como canal preferencial de compra se mantenha nos próximos tempos (e talvez para sempre mudará os hábitos de consumo das pessoas). Como tal, vamos manter a nossa aposta numa equipa multidisciplinar no online e ao nível das operações, de forma a assegurarmos uma resposta rápida e eficiente a quem nos procura em mo-online.com», esclarece Diana Teixeira Pinto.
A MO abriu 110 lojas físicas a 1 de junho com medidas de segurança reforçadas, incluindo a utilização obrigatória de máscara e circuitos de entrada e saída identificados. «Disponibilizamos gel desinfetante à entrada do espaço e no balcão de pagamento – e recomendamos que sejam utilizados métodos de pagamento alternativos ao dinheiro, como o cartão multibanco ou via contactless. Nesta fase, os nossos provadores encontram-se temporariamente encerrados. Por último, as devoluções de compras serão desinfetadas com vaporeta ou desinfetante – e caso não seja possível uma desinfeção imediata, os artigos ficam em quarentena por um período de 48h», enumera. «Queremos garantir a máxima segurança a todos aqueles que nos visitam», sublinha.
Diversidade de opções
O mesmo princípio tem sido adotado por outros retalhistas a operar no mercado português, que tal como a MO, procuraram encontrar soluções para se aproximarem dos consumidores. O Grupo Brodheim destaca no seu LinkedIn que «valorizamos a conveniência e segurança dos clientes», oferecendo opções de “Pick & Go” nas lojas Furla, Guess, Timberland e Vans, aproveitando o serviço disponibilizado pelos centros comerciais da Sonae Sierra, onde os consumidores podem recolher no parque de estacionamento os artigos comprados por telefone ou encomendados online.
«Inovação, flexibilidade e proatividade sempre fizeram parte do nosso ADN. Desde o primeiro dia da pandemia que temos respondido à situação com o desenvolvimento de novos conceitos para responder às necessidades em evolução de visitantes e locatários [dos centros comerciais]. O confinamento mudou comportamentos, mas o omnicanal era já uma tendência, que assumiu ainda maior importância como parte do novo normal. Hoje, mais do que nunca, a ligação entre as lojas físicas e as suas homólogas digitais é essencial», garantiu Cristina Santos, diretora de gestão de ativos para Portugal e Espanha da Sonae Sierra, que estabeleceu também uma parceria com o Dott para permitir aos lojistas dos seus centros comerciais venderem online.
A Decenio, por seu lado, manteve o lançamento da coleção #decenioalexandramoura online e acrescentou uma coleção de básicos à sua oferta, com t-shirts e polos. «Numa altura como a que atravessamos, de isolamento social, sentirmo-nos bem e confortáveis é essencial para mantermos uma rotina de trabalho e um ambiente positivo à nossa volta», afirma a marca do grupo Cães de Pedra, que tornou as entregas, devoluções e trocas gratuitas, alargou o prazo de devolução para 60 dias e reforçou o apoio ao cliente, com contactos por email, telefone e WhatsApp.
De igual forma, a MO desenvolveu «outras soluções de compra: um serviço de atendimento via WhatsApp ou telefone, que permite de uma forma personalizada e direta que o cliente possa falar com um colaborador da sua loja MO de eleição, e realizar as encomendas dos artigos com o máximo conforto. Adotámos ainda um modelo de venda por postigo, onde o cliente podia levantar as suas compras online ou efetuar alguma compra no momento sem nunca entrar na loja», desvenda Diana Teixeira Pinto, que considera que os últimos meses foram «um período de imensos desafios, mas um período de enorme aprendizagem, que nos tornará mais fortes no futuro e que nos permitirá oferecer uma experiência verdadeiramente 360º para o consumidor».
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