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Estela Ataíde
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29 de mai. de 2018
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Nicolas Ghesquière: quando a excentricidade do local influencia a coleção

Traduzido por
Estela Ataíde
Publicado em
29 de mai. de 2018

Quando Nicolas Ghesquière organizou a sua quinta coleção cruise para a Louis Vuitton, na noite de segunda-feira, numa famosa fundação de arte na Cote d'Azur, praticamente inventou uma nova categoria de design - alta moda inspirada em locais específicos.

Apresentada no caminho de cascalho da lendária Fondation Maeght, empoleirada numa encosta íngreme acima da antiga vila de St Paul de Vence, a coleção de 61 peças também foi intencionalmente excêntrica, e ainda bem.

A FashionNetwork.com conversou com Ghesquière após o desfile, depois de o designer posar para fotografias com uma dúzia de atores - incluindo Sienna Miller, Jennifer Connolly, Emma Stone e Justin Theroux -, para discutir o equilíbrio entre a arte de criar uma forte assinatura de moda e integrar-se no contexto do momento.


Nicolas Ghesquière, ao centro, com DJ Woodkid (esquerda) e Jennifer Connelly (direita), em frente a uma escultura de Joan Miro na Fondation Maeght - Photo: FashionNetwork.com/ Godfrey Deeny


 Por que escolheu este local?

“É um lugar que amo há muitos, muitos anos. Acho que vim aqui há mais de 25 anos. Apaixonei-me pela fundação e voltei muitas e muitas vezes. Estive aqui em julho passado e tinham começado as discussões sobre onde iríamos apresentar a coleção cruise da Louis Vuitton. Então, quando voltei para Paris, disse: "Por que não prestamos homenagem à génese de uma fundação de arte?", à história de amor entre uma família e artistas e arquitetura. E propus essa ideia a Monsieur Arnault (presidente da LVMH, proprietário da Vuitton), Delphine (Arnault) e Michael Burke (CEO da Vuitton), e é claro que eles adoraram. Foi assim que começou e é por isso que estamos aqui hoje”, disse Ghesquière, em pé diante de um enorme mármore branco de Joan Miró.

Na década de 1950, Marguerite e Aimé Maeght, galeristas de Miró, contrataram Josep Llúis Sert para começar a construir o espaço, a primeira fundação privada de artes visuais da Europa. Trata-se de uma obra-prima da arquitetura modernista, praticamente repleta de grandes obras de escultura. Murais gigantescos e pinturas de Ellsworth Kelly, Marc Chagall e Vassily Kandinsky, cujas cores inundaram grande parte da coleção. Um vestido de cocktail amarelo, branco, prateado e preto quase parecia criado a partir de uma cerâmica de parede de Fernand Leger. 
 
Quais são as ligações entre toda a arte moderna em exposição e a coleção?

”Certamente o cascalho tinha que ser considerado!", diz o designer rindo alto. "Faz parte do som e do feeling deste lugar. E por isso é que tínhamos as nossas sapatilhas novas”, disse sorrindo, referindo-se às notáveis novas sapatilhas-bota de cano alto usadas por metade do elenco.

“Para mim, é mais interessante pensar que tipo de mulher pode evoluir neste tipo de ambiente. Foi um objetivo imaginário meu. Este desfile é sobre excentricidade. Sobre como um indivíduo pode criar o seu próprio estilo, e eu adoro esta ideia de alguém que mistura as coisas de uma maneira única. Foi assim que trabalhei com Grace Coddington.”

Coddington, a agora reformada diretora de moda da American Vogue, brincou com o icónico monograma da LV durante todo o desfile, injetando ilustrações dos seus dois gatos, Pumpkin e Blanket, juntamente com desenhos de Léon, o Labrador castanho de Ghesquière.

“Há muitos anos que queria trabalhar com Grace. Somos amigos e esta foi uma grande oportunidade de criarmos, juntos, todas estas carteiras. Temos uma relação de cão e gato! Ela é pessoa de gatos e eu sou mais de cães.”


Em cima: Look da coleção Louis Vuitton Resort 2019 (Photo: Pixelformula). Em baixo: Cerâmica de parede do artista Fernand Leger (Photo: FashionNetwork.com/ Godfrey Deeny)


Grande parte da coleção refletia espaços individuais e esculturas presentes na Fundação.

“Quando chegou a altura de encenar o desfile, foi difícil decidir se deveria acontecer no pátio Giacometti ou no labirinto Miró. Ou a atravessar a escultura de Alexander Calder no relvado da frente. Mas, acabámos por decidir fazer um tour pelo espaço. Assim, a forma das estátuas influenciou muito a minha silhueta. Absolutamente. Quando desenhamos roupas há sempre uma luta com a gravidade. Queremos que sejam leves ou suspensas, ou que se movam com o corpo da mulher. É por isso que existe esta relação entre movimento e estes maravilhosos monólitos da arte. Há algo bastante magnético nisso.”

Cerca de 600 pessoas compareceram ao desfile, metade das quais clientes, tendo todas sido convidadas no dia seguinte para ver e encomendar os looks diretamente a partir do desfile num enorme showroom que a Vuitton criou para a ocasião na Croisette, em Cannes. Muitos dos detalhes e das cores pareciam inspirados na localização. Está correto?

“A paleta do local é muito específica. A paleta cromática está muito relacionada com os anos sessenta, quando a fundação foi construída. Por isso, a minha resposta foi apresentar uma paleta cromática que fosse mais ao estilo de Miami, algo muito ácido."
Na semana passada, Ghesquière publicou no Instagram a notícia de que havia renovado o seu contrato com a Louis Vuitton. A sua publicação foi marcada com a hashtag #notgoinganywhere e foi, compreensivelmente, uma importante notícia, considerando todas as mudanças drásticas de direção que ocorreram nas grandes casas no último ano.
 
Quão importante é, para este designer, a iconoclastia e quebrar as regras?

“É importante, mas também é importante construir um vocabulário. E é o que eu tenho vindo a fazer há cinco anos com a Louis Vuitton. Todos sonhamos em brincar com o vocabulário, agitá-lo e transgredi-lo, ao mesmo tempo que sonhamos estar no momento presente. Todos os designers se esforçam para responder à necessidade e desejo de ter novas emoções na moda. Portanto, há um equilíbrio constante entre querer durar muito e ter uma assinatura, mas também ser atual. É por isso que escolhi este tipo de moda e este trabalho.”

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